2003/07/05

Paradigma de um estilo de governação 

Lamentável a cedência governamental ao coro muito bem ensaiadinho que defendeu Burmester em uníssono. O ministro deve ter visto o site da TSF que coloca frente a frente os que querem que o pianista fique e os que acham que ele deve sair - claro, a decisão foi um inequívoco "NIM". A indignidade desta decisão é ampliada pelas revelações do relatório da Ernst&Young que comprova, uma vez mais, a péssima gestão que o "Porto 2001" sofreu. O caso assume ressonâncias gravíssimas e eventualmente criminais, conforme está descrito no comunicado do presidente cessante da Casa da Música, Rui Amaral. Em toda esta questão, ficam a perder os que ainda entendem que a lisura de processos é essencial na política. Mas os grandes derrotados são, sem dúvida, os accionistas, Governo e Câmara do Porto, nomeadamente o ainda ministro Roseta e Rui Rio. Apesar do elenco da nova administração permitir boas expectativas. Pode ser que este caso venha a ser futuramente julgado em diferente contexto.

Desilusão 

Burmester continua na Casa da Música, na qualidade de consultor do novo Presidente.
Decididamente, neste País o crime compensa. Este governo tem facetas a lembrar claramente o "guterrismo". O vergar-se às corporações em função do volume de decibéis que estas emitem é uma delas.
Os supostos tigres rugem muito, mas a maioria deles são de papel. Esta incapacidade do governo em reconhecer isto, em enfrentá-los e em provocar rupturas no momento adequado, vai-lhe sair caro no futuro.

Uma vez mais, a "constituição" europeia 

Estranhamente, o artigo da passada quarta-feira do Prof. Jorge Miranda acerca da "constituição" europeia, não teve a atenção merecida nos blogues. Um desinteresse incompreensível perante o debate mais relevante para o nosso futuro - muitíssimo mais do que as "patacoadas" exteriorizadas no parlamento durante o "Estado da Nação". Ainda que quase só, o Mata-Mouros vai persistir nesta discussão.

Elogio da incorrecta resposta 

Correndo conscientemente o risco da redundância, quero sublinhar o realce que o meu colega Matador, CL, já aqui apontou, quanto ao magnífico artigo da Helena Matos. Esta senhora é um caso sério na arte de bem escrever e de melhor exibir a lucidez do comentário político e social, no nosso país. Para mim, está a distanciar-se inapelavelmente dos seus mais directos competidores.

P.S. Apesar do desgosto que a personagem me inspira, um conselho piedoso ao EPC: desista e não ensaie uma tentativa de resposta! Poupa a si mesmo um vexame quase certo. É que nesta questão, para além de não ter razão, falta-lhe o talento e o desassombro necessários para rivalizar com contestações deste calibre...

Ainda os parlamentares da web 

Afinal, houve quem não esperasse pelo servidor público.

Politicamente correcto 

"O fenómeno dos blogues chegou oficialmente à Assembleia da República (AR). A partir da próxima legislatura, os deputados parlamentares podem usufruir da possibilidade de criar blogues numa área reservada para esse mesmo efeito instalada no servidor da AR.". O resto do texto está aqui. Como neófito nisto dos blogues, não sei muito bem o que pensar, mas causa-me algum espanto a ideia de blogues alojados no servidor oficial do Parlamento, com livro de estilos e tudo, quando é certo que qualquer deputado que pretenda entrar na blogosfera o pode fazer com grande facilidade. O que pensa o resto da blogosfera sobre o assunto?

Entretanto, recomendo vivamente a leitura do excelente artigo de Helena Matos, no Público de hoje.

2003/07/04

Mais Música 

E não é celestial! É da Casa da dita.
Com a verve que se lhe conhece, António Neto da Silva zurze aqui (e muito bem) o nosso tradicional laxismo. E é este laxismo que fará mais uma vez a culpa morrer solteira, mesmo após se constatar a dimensão do escândalo através da auditoria da Ernest & Young que recentemente veio a público ou através de outra que o Tribunal de Contas venha a fazer.
Enfim, questões "incontornáveis"...

Atenção: Berlusconi não é António Guterres (ainda bem para a Itália) 

JPN, em O Complot, responde à  letra à  minha "posta" acerca da impossibilidade natural de Berlusconi ficar quieto e parado perante os acintes de que estava a ser ví­tima no Parlamento Europeu. Relendo os precisos termos em que escrevi o texto, reconheço que pode parecer que JPN tem razão - na verdade, é lí­quido que quem desempenha as altas funções europeias que o primeiro-ministro italiano actualmente tem deverá ter algum cuidado com as suas exuberâncias comportamentais. O que não é a mesma coisa que esperar de Berlusconi a "frieza e educação suficientes para poder aguentar todo o tipo de insultos e insinuações". Essa não. Primeiro a frieza: Berlusconi, patentemente, não é escandinavo nem tenciona assumir-se como um gentleman britânico. É 100% italiano. Como quase todos, grita constantemente, esbraceja e reage aos insultos de imediato. É uma questão cultural e não de etiqueta.
Em segundo lugar, a educação: não é parte integrante desse conceito "aguentar todo o tipo de insultos e insinuações". Com toda a franqueza, pelo contrário. Se ser bem educado é aguentar quedo e mudo as desconsiderações que nos são dirigidas, se é conforme às boas regras sociais e polí­ticas uma pessoa "ficar-se" quando é injuriado e, como dizem os brasileiros, "levar o desaforo para casa", então, caro JPN, muito obrigado, pois graças a si, após estes anos todos, descobri que também não sou bem educado (pelo menos, nesse conceito).

Não tem, afinal, razão, JPN. Todo este barulho à  volta de uma reação, porventura exagerada, mas natural e compreensí­vel face às circunstâncias, só acontece porque o agente foi Berlusconi. Porque está na moda e é politicamente correcto (quase um sinal de "inteligência" e cosmopolitismo) dizer que o homem é um misto de ogre e palhaço. Confesso não ter ainda uma opinião completamente formada sobre a pessoa; mas, tenho uma bastante bem fundamentada sobre a campanha internacional que se faz há anos contra ele. Um dos maiores "complots" dos nossos tempos, não acha?

2003/07/03

O mais politicamente correcto do "politicamente correcto" 

O excelso árbitro do "politicamente correcto" português veio defender a sua coutada – ninguém mais se atreva a escrever acerca do tema sobrepondo-se à sua superior chancela. Atacando os atrevidos que puseram o pé nos seus terrenos, EPC entende que falar no “politicamente correcto” é um chavão. Chavão? O uso contínuo de expressões gastas e vazias de sentido? A utilização de fórmulas cuja elegância e oportunidade permite amparar teses e argumentos fragilizados embora estejam destituídas de significado? Mas essas são as descrições mais perfeitas das crónicas diárias de EPC!
Apesar deste, perversamente, ter anunciado querer reescrever o entendimento do “politicamente correcto”. Ou seja, sabendo que está contaminado por esse mal para todo o sempre, EPC pretende branquear o conteúdo do depreciativo epíteto.
E vai logo adiantando que desse vício se padece à esquerda e à direita. Dando exemplos concretos. Evidentemente, trata-se de um argumento exemplarmente, tipicamente, emblematicamente, POLITICAMENTE CORRECTO!
Era só o que faltava: os que nos encharcam quotidianamente com análises, comentários, sentenças, críticas, avisos, opiniões, comportamentos, anátemas, conselhos, etc., do mais “politicamente correcto” possível, surgirem agora levantando véus de confusão para afirmarem que não são aquilo que sempre foram. O Mata-Mouros estará atento e precavido.

Quem não se sente... 

Discordo da interpretação que o Abrupto - e muito mais da do Aviz mesmo após a correcção - faz daquilo que se passou no Parlamento Europeu com Berlusconi. Nomeadamente, na parte das eventuais responsabilidades que possam ser assacadas ao primeiro-ministro italiano. Não percebo como é que se espera que um dirigente político a exercer aquelas funções possa aguentar fria e placidamente o coro de insultos, insinuações e desmandos, por parte da corja ultra-esquerdista a quem tudo é permitido. Fiquei muito mais descansado depois de ler o Valete e o Comprometido Espectador e, claro, a Causa Liberal.

O paí­s ficou sossegado, senhor primeiro-ministro! 

No debate do Estado da Nação, o Governo fez previsões fanaticamente optimistas quanto à  evolução da situação económica e social. Tudo está a ir bem, muito longe do "pântano" guterrista e da "tanga" nacional de há alguns meses. O investimento estrangeiro cresce, o desemprego está prestes a baixar, quiçá a desaparecer, a confiança dos agentes económicos é cada vez maior, as listas de espera nos hospitais são quase uma recordação, as nossas universidades são nichos de excelência, a criminalidade diminui a olhos vistos, a Segurança Social começou a pagar os subsí­dios com apenas alguns dias de atraso em vez do 9 meses (?!) do costume, a morosidade judicial está muito atenuada, o caos urbaní­stico está praticamente corrigido, não há problemas ambientais, a cultura poruguesa vai de vento em popa, a Administração Pública - perante o aviso da reforma iminente - corrige-se todos os dias e colocou-se entre as mais eficientes do mundo civilizado.
Qual a fundamentação deste milagre? A resposta é simples: Durão Barroso esclareceu que "este Governo não é liberal"! Aí é que bate o ponto. Essa é a razão do desempenho extraordinário deste executivo, "eles" não são liberais. Daí­ estar tudo a correr pelo melhor. Logo, Durão Barroso fez uma interpretação autêntica da sua asserção, elucidando que a justificação dessa negativa é que "também apoiam o social". Está tudo dito. Mais até do que seria exigí­vel. Estou pessoalmente convencido que Barroso, com a sua doutrinária lição (é o doutoramento que nunca acabou!), fez avançar a ciência polí­tica esta tarde em pleno parlamento. O ideário polí­tico nunca mais será o mesmo depois desta demonstração de erudição e genialidade: não somos liberais, porque também somos amigos do social (será que se referia à  Paula BBobbonne?). Magní­fico! Bravo, senhor primeiro-ministro!
Continue a ser igual ao seu antecessor, brinde o paí­s com estas verdades tremendas, continue fiel a esta lógica socialistazinha de meias-tintas e verá como o seu fim será tão semelhante ao do último que esteve no seu lugar e dizia mais ou menos as mesmas coisas.

2003/07/02

GESTÃO DANOSA NA "PORTO 2001" 

A oportunidade do ataque a tudo e a todos (accionistas, Governo e Câmara do Porto, conselho de administração da CM) do pianista-ex-administrador da Casa da Música começa agora a fazer sentido. Curiosamente, foi na véspera de conhecermos um relatório de uma reputada firma de auditoria que desmontou por completo as contas da "Porto 2001". Afinal, Burmester quis fugir para a frente, salvaguardando (politicamente) a sua posição e a dos seus amigos (Teresa Lago e Paulo Cunha e Silva). Quis (e conseguiu) fazer cair a administração que tomou conta da Casa da Música há um ano e que estava quase a desvendar a verdade do regabofe dos anos anteriores. Agora está lá tudo preto no branco: dinheiros desaparecidos, imóveis e projectos que não entraram nas contas e um prejuízo que ultrapassa o dobro do declarado por esses senhores!
Lembrem-se que um dos principais responsáveis por aquela administração - Paulo Cunha e Silva - acabou de ser nomeado da presidente do Instituto das Artes!!! Realmente o homem provou ser um artista, mas não exactamente na área da cultura.
O Mata-Mouros, no cumprimento intrínseco da missão que tem por nome, propõe que os administradores e colaboradores com responsabilidades de gestão da ex-PORTO 2001 sejam processados por gestão danosa. Para já. Estou convencido que mais matéria criminal será descoberta quando surgir o tão esperado relatório do Tribunal de Contas. Por menos do que isso (e não se tratava de dinheiro dos contribuintes) os ex-gestores da Moderna foram a Tribunal e alguns estão presos...

Loucuras 

A Charlotte fez uma prosa magnífica sobre a "Loucura". Um oposto a Pessoa na "Mensagem" (D. Sebastião, Rei de Portugal). Em quem estaria Charlotte a pensar?

Reforma da Administração Pública? 

Estou a ver o "Prós&Contras" (este programa está cada vez mais fraco!) acerca da reforma da Administração Pública que o Governo se propõe levar a cabo. A minha curiosidade profissional cedo se desvaneceu. Será que alguém acredita que este Governo é capaz de mudar o que quer que seja? Eu já não. No caso RTP bradaram, ameaçaram, quase acreditei que iriam fazer alguma coisa. Depois, quando lhes fizeram frente, recuaram como cordeirinhos. Aninharam-se. Cederam. Pagaram chorudíssimos prémios aos boys socialistas que lá estavam e ficou tudo como dantes. Pior, repristinaram a taxa. O Código de Trabalho, anunciado como reforma fulcral, nunca passou de uma tímida arrumação das leis avulsas que estavam em vigor. De substância, quase nada mudou. E o pouco que existia de inovador foi sendo paulatinamente tosquiado no jogo de arrecuas que o Governo encetou há vários meses. Culparam a Constituição, mas o argumento só é válido parcialmente - a responsabilidade está nesta realidade indesmentível : "eles" fazem parte integrante deste sistema. Geraram-se nele, vivem dele e para ele. Não podem, obviamente, dar-lhe fim. Seria um "hara-Kiri" ou "seppuku". Na mesma linha, eram contra o imposto mínimo mas criaram o pagamento adiantado por conta (o meu supremo espanto e fúria é que ainda há seres que os qualificam de liberais! Quase me dá vontade de vociferar à maneira do "pipi").
Esta reforma terá o mesmo fim de todas as outras - o consenso sebáceo, o acordo de eunucos, i. é a reforma "possível".
EM RESUMO: (escrito em politicamente correcto) Vai-se reorganizar alguma coisa mas nada de drástico irá acontecer. No fundo, todos estarão de acordo quanto a isso. Aliás este não é o melhor momento. Mais vale um passo seguro do que correr para um eventual abismo. Depois há o problema da conflitualidade social. O Presidente da República (quem?) deseja que se construam equilíbrios (o quê?). Pelo menos, estamos no bom caminho. E - claro - o que é preciso é (muita) serenidade!

2003/07/01

Silly Season III 

Esta demagogia recorrente de se criarem indiscriminadamente vilas, cidades e, pior que tudo, concelhos, denota uma completa ignorância e falta de visão estratégica para o País. Por um eleitoralismo barato, está-se a fazer precisamente o contrário do que devia ser feito.
Se há algo(???) para fazer neste País para além da reforma da Administração Pública, é deitar ao lixo, porque completamente caduca, a reforma administrativa de Mouzinho da Silveira. E a nova divisão administrativa do País deveria passar pela fusão e extinção de concelhos e nunca pela sua proliferação. É perfeitamente irresponsável estar a criar concelhos com uma dimensão humana menor que muitos condomínios privados. Que massa crítica terão estas entidades para assumir responsabilidades ao nível, por exemplo, da gestão escolar?
Este País não comporta mais de 100 concelhos devidamente redimensionados para população da ordem dos 100.000 habitantes. E, já agora, haveria que extinguir as Juntas de Freguesia que não servem para nada.
Ao contrário de muitas, esta seria uma reforma que poupava dinheiro ao contribuinte.

Ainda a propósito das dores de cabeça do Ministro da Cultura 

Andava hesitante quanto a comentar a descabelada nomeação de Paulo Cunha e Silva para presidente do Instituto das Artes. Embora tenha ficado perplexo, duvidava que o assunto merecesse uma "posta". Mas a despudurada reescrição da história que a imprensa tradicional anda a efectuar acerca do nomeado aguçou-me a vontade.
Vamos lá ver, de onde surgiu o nóvel "artista"? É professor universitário, dizem. Mas não consegui perceber qual a sua área de investigação, as suas teses e dissertações, o seu contributo para a Ciência. Parece que dá aulas numa coisa chamada "Faculdade de Motricidade", um nome pós-moderno e politicamente correcto para designar a prosaica "Ginástica". Talvez isso não seja muito importante, já que tem feito o seu percurso mais mediático na zona híbrida da cultura pública. Nomeadamente com figura relevante na gestão do Porto 2001. O Matador de Mouros, CL, já demonstrou o descalabro das contas desse infeliz evento. Mas aquilo que muitos não sabem, porque estão longe do Porto, é o tremendo falhanço que aquela realização constituiu, praticamente a todos os níveis. A incompetência revelada por todos os que estiveram ligados ao Porto 2001 está já no domínio da lenda e circula livremente no anedotário tripeiro. Mas, desde há séculos, que está estabelecida uma verdade sobre a "arte" de alguém se fazer de importante diante dos "saloios" da capital: basta que dê ares de quem é muitíssimo considerado perante os "parolos" do Norte! Foi o que o Dr. Paulo C e S soube fazer com demasiado talento. Cumulativamente, tornou-se articulista no DN (escreve bem, pelo menos) onde semanalmente bate forte e feio no Governo e no Dr. Rui Rio.
Apesar disso, nada fazia prever que fosse nomeado para tão importante cargo. Não tem currículo universitário e possui um péssimo currículo profissional. Tem é muitos amigos jornalistas. Só que este Governo já chegou à terrível fase do "Guterrar". Se lhes batem, eles cedem e "baixam as orelhas". Foi o que o senhor Ministro fez com pouca arte e nenhuma coragem. Qualidades (falta delas) que já havia revelado na escabrosa demissão da única Administração da Casa da Música que conseguiu tirar a obra do buraco em que a haviam metido. Porque lhe tinham berrado, o Governo borrou-se! Agora nomeiam um declarado inimigo, patentemente sem condições para preencher essas funções, só para alívio das próprias costas. O exemplo do antigo primeiro-ministro deixou lastro e muita escola.

Silly Season II 

Outro sintoma recorrente do periodo pré-férias, que serva para aumentar a produtividade do parlamento (quiça para ajudar Mota Amral a justificar as faltas...), multiplicando o número de leis aprovadas, é a elevação de aldeias a vilas e destas a cidades. Este ano, o instrumento produtivo foi afinado por um diapasão diferente: a criação de concelhos. Não há muito tempo, foi aprovada uma lei-quadro da criação que estabeleceu critérios mais ou menos objectivos a que deveria obedecer a criação de novos concelhos e freguesias, como forma de pôr termo a pretensões infundadas e a decisões arbitrárias. Eis senão quando, ainda antes de entrar em vigor uma alteração que torna totalemente inúteis os tais critérios, são criados "na generalidade" (ficam a aguardar as alterações, para serem votados na especialidade), dois novos concelhos, que não preenchem os pressupostos da lei em vigor. Contavam-me há uns dias uma resposta de um aluno num exame de direito: "se não houvesse constituição, isto era uma barafunda". O aluno não leu certamente os manuais e não conhece a prática parlamentar portuguesa. Com constituição (ou leis-quadro) ou sem ela, abre-se sempre uma janela...

Mais dores de cabeça para o Ministro da Cultura 

Quando no último dia do ano de 1998 foi criada a sociedade "Porto 2001, S.A.", utilizando-se uma figura jurídica reservada a entidades com fins lucrativos, já se sabia que tal "S.A." seria, obviamente, deficitária. A dúvida era, então como agora, a de saber a dimensão do "buraco" (isto não é, para já, uma crítica ao evento, mas apenas à forma jurídica utilizada). A dr.a Teresa Lago, reconhecia há um ano (quando a "Porto 2001, S.A." terminou) um défice próximo dos 10 milhões de euros. Verifica-se hoje que era quase o dobro , de acordo com uma auditoria encomendada pela administração cessante da "Casa da Música/Porto 2001, S.A.". Rui Amaral aproveitou o balanço para disparar em vários sentidos, nomeadamente contra Paulo Cunha e Silva, recém-nomeado Presidente do Instituto das Artes, que hoje mesmo se sentiu obrigado a negar ser um boy e que desempenhou funções de programador da Porto 2001. As reacções dos visados não devem tardar. A novela Casa da Música ameaça preencher a silly season que se aproxima

A hora da Itália 


Estes são os dois homens do momento, respectivamente, o Presidente do Conselho de Ministros da União e o Presidente da Comissão Europeia. Em comum: são ambos italianos, ocuparam ambos o cargo de primeiro-ministro de Itália, nasceram ambos na Itália próspera do norte e ambos têm experiência empresarial, o primeiro no sector privado, o segundo no sector público. No mais, são diferentes em tudo, além de rivais de longa data. Ambos parecem querer a aprovação da "Constituição Europeia". O segundo por dever de ofício, o primeiro pelo prazer de ver o texto fundamental da UE ser, novamente, o "Tratado de Roma (II)". Em 2006, irão provavelmente enfrentar-se nas eleições legislativas italianas. Qual será o impacto desta coabitação? Um mau resultado será um argumento poderoso para a criação da figura do presidente do conselho permanente. Um bom resultado pouco ou nenhum impacto terá na reforma institucional. De qualquer modo, a presidência italiana será certamente diferente da "neutral" presidência grega. Ao contrário da Grécia, a Itália é um dos "grandes", mas um dos grandes desalinhado do eixo franco-alemão, bem mais próximo dos Estados Unidos e defensor (com Berlusconi) de um rápido e intenso avanço para Leste (Turquia e Israel incluídos). É de seguir atentamente as cenas dos próximos capítulos...

Um equívoco chamado Casa do Douro 

Pela enésima vez nas últimas décadas, uma direcção da Casa do Douro diz que está à  beira da falência e exige fundos do Estado para a sua sobrevivência. Uma questão coloca-se, de imediato: qual a utilidade da Casa do Douro?
A Casa do Douro serve, sobretudo, um modelo de intervenção do Estado. Tem em vista uma ideia de controlo centralizado da produção do vinho do Porto - um organismo público que diz quem pode fazer vinho do Porto, em que quantidades e a que preço é que este será comprado. Ou seja, o Estado, indirectamente, conforma e dirige o mercado.
Durante alguns anos, o sistema pareceu funcionar, embora de modo continuamente imperfeito. Lembro-me de ter visto coisas extraordinárias, como inspecções da Casa do Douro a quintas com centenas de pipas de produção em que os "veneráveis" inspectores públicos, em dois ou três minutos, graças ao seus potentíssimos "olhos clí­nicos", "avaliavam" ao centilitro o número de pipas de vinho do Porto que aquela exploração teria direito naquele ano de produção. Eram os famosíssimos "Cartões de Benefí­cio". Um rectângulo mágico que certificava o sucesso ou declarava a ruí­na do seu possuí­dor. E era de "possuí­dor" que se deve falar, já que esse privilégio estatal - como toda a gente sabe e sempre soube - foi, desde a sua criação, objecto de um intenso comércio ilegal que faz com que unidades agrí­colas sem quaisquer condições tenham excelentes quotas de produção, enquanto outras, muití­ssimo mais aptas, ficam impedidas de fazer o vinho do "benefício".
Depois, à  medida que o comércio viní­cola teve de "suportar" a lógica da sociedade aberta, esse sistema revelou a sua verdadeira face: é caduco, injusto, limitado e castrador do livre comércio.
Os agentes económicos foram-se desinteressando da Casa do Douro. Os produtores fizeram as suas próprias marcas e passaram a negociar directamente com os interessados. O apertado controlo sobre o vinho do Porto fez com que muitos descobrissem novos mercados para o vinho de consumo. Empanturrada de vinho que não consegue escoar, a Casa do Douro asfixia há vários anos. Os seus responsáveis bradam acerca da "obrigação" que os comerciantes têm de lhes "comprar o vinho". Querem vigilância, polí­cia, sanções. E dinheiro! Muito dinheiro que sustente esse sistema que mantém alguns à  custa do esforço de todos. Tomando a atitude dos portugueses que não sabem resolver os seus próprios problemas, exigem a intervenção do Governo. Que não se faz rogado. E, de Lisboa, avança um senhor ministro arvorado em especialista e empenhado em tudo baralhar para que, no fim, tudo fique exactamente como está.
A resolução da questão é radicalmente simples: deixar o mercado funcionar. Não impôr quotas, condições irracionais, nem deixar subsistir esquemas de fiscalização de que a corrupção e o laxismo se alimentam naturalmente. Deixar que a quantidade de produção e a sua qualidade seja aferida pela única entidade que sempre o conseguiu fazer com eficácia - os consumidores que sabem aquilo que é bom para eles, sem necessidade de um organismo de raízes mercantilistas que tenha o monopólio de decidir por todos. Acabe-se com essa estrutura desajustada e salvem-se os vinhos do Douro e do Porto.

2003/06/30

Virar o bico ao prego - os "gays" querem silenciar toda a gente! 

Num assinalável exercício político de "virar o bico ao prego", um dirigente do Bloco de Esquerda vem carpir contra a atitude de Helena Matos (actualmente, talvez a melhor prosa da imprensa portuguesa) na sua paciente tarefa de "pôr os pontos nos iis" quanto à descabida intenção de um grupúsculo "gay" em processar João César das Neves. Os que autoritariamente pretendem calar e impôr a sua visão do mundo e das coisas, os que não aceitam qualquer opinião divergente, agora surgem armados em vítimas (que nunca o foram). Processam quem se atreve a dizer o que pensa e acusam quem o faz de intolerância. Notável. Afinal o que querem esses senhore(a)s?

Ainda a PAC 

Do leitor Cincinato recebemos o e-mail que a seguir se transcreve em itálico, o qual também foi remetido ao Intermitente, Valete Fratres, Blog de Esquerda e Dicionário do Diabo:

Quando se fala ou escreve de Política Agrícola Comum é tudo feito com uma ligeireza, como se escreve-se para a Lux ou para a Caras. Um bom exemplo foi o que encontrei no blog intermitente e no mata-mouros.
Os lugares comuns que de apresentar a PAC como o bode expiatório dos males do terceiro mundo, faz-me penasar que isso não passa de um afago de uma falsa consciência social.
A PAC é cara no seio do Orçamento comunitário e está concerteza cheia de incoerências (particularmente os subsídios à exportação) mas, talvez porque seja, efectivamente, a única política comum da União Europeia, se mais houvesse (e tanto se pede por elas)...
O facto de os produtores agrícolas terem visto os preços agrícolas reduzidos em mais de 50% desde o início dos anos 90 por políticas anti-inflacionistas, isso não merce compensação?
Em Portugal este papel malfadado da PAC explica-se em muito por uma sociedade recentemente urbanizada que quer esquecer o seu passado recente rural e pobre.
Penso que deve existir um debate e que este merece ser mais aprufundado e sério, pelo que lanço algumas questões:
Qual o papel da agricultura nos países europeus e em Portugal, este deve resumir-se unicamente aos aspectos de actividade económica?
Será que não se encontram inúmeras externalidades positivas no sector primário?
A ocupação territorial e o abandono das terras é uma boa opção (ambiental, turistica, cultura e arrisco mesmo a dizer para a nossa identidade nacional...)?
Alguém acredita que as actividades económicas e fixação de população em cidades médias e vilas do interior do país se faz sem agricultura e ocupação do espaço rural?
A dependência alimentar externa é uma boa opção? No caso de passarmos a ter essa dependência como é que poderemos actuar num problema de segurança alimentar (tipo vacas loucas) num país (terceiro) fornecedor?
“Os países pobres que nos dêem alimentos (baratos) que nós investimos lá” é essa a vossa opinião?, então mais vale a pena voltarmos a criar umas quantas colónias nessa gente de segunda.

cincinato


Vamos ver se consigo ser sintético e exaustivo q.b.. Irei dividir a resposta em 3 partes:
1. Ligeireza - confesso que nunca li a Lux nem a Caras, portanto desconheço o “peso” dos seus artigos; não sei se é ligeireza “apresentar-se a PAC como o bode expiatório dos males do terceiro mundo”, mas quem também o faz é o insuspeito Lula e admito que com muito maior conhecimento de causa do que nós. Aliás, a reforma da PAC recentemente votada, foi-o em grande medida por pressão dos países do terceiro mundo e constitui de certa forma uma protecção do “calcanhar de Aquiles” da UE para as próximas negociações de Doha.
Não me vou pôr a reafirmar a minha “consciência social” que, pelos vistos, seria sempre considerada falsa. Prefiro então assumir uma “desprezível” postura liberal (ou neo-liberal se assim quiserem, embora me pareça que o prefixo tem apenas fins pejorativos) e reconhecer que a minha posição decorre apenas e tão só de um egoísmo atroz. Explico: sabendo-se que a “malfadada” globalização encolheu o mundo, mais fàcilmente serei afectado por algo de mal que se passe do outro lado do dito; assim, e numa atitude puramente defensiva, só me resta desejar que os povos do terceiro mundo cresçam, se desenvolvam, não me importando nada que fiquem maiores do que eu. Se tal acontecer, os meus filhos terão amanhã emprego garantido e porventura bons empregos. Tenho esta “detestável” mania de pensar no longo prazo, altura em que estarei por certo morto...
2. Custos da PAC - Diz o Cincinato que a PAC é cara por ser a única política comum da UE. Se bem interpreto, a sua tese é de que “se mais políticas comuns houvera, menos a PAC gastara”. Em termos relativos, será verdade. Mas se nos pomos a pedir mais políticas comuns, o resultado imediato será mais um sorvedouro do bolso do contribuinte. Sempre que se trata de criar novas políticas ou programas que pressuponham financiamentos públicos, desde há muito que faço esta pergunta basilar: quem ganha e quem perde? Tenho chegado quase sempre à conclusão que perde (paga) a maioria (geralmente o contribuinte anónimo) e ganha (recebe) a minoria (quase sempre uma corporação parasitária). Numa perspectiva liberal isto é inadmissível, porque estamos perante um enriquecimento sem mérito; numa perspectiva socialista, isto deve ser (teoricamente...) escabroso, porque significa alguns ganharem à custa de quase todos. Sobre o efeito “anestésico” deste processo, já me referi há uns dias atrás na “posta” sobre a RTP. Devo dizer ainda que a minha “frieza” liberal faz com que não me comova minimamente com os “coitadinhos” vítimas de uma “redução dos preços agrícolas em mais de 50% desde o início dos anos 90 por políticas anti-inflacionistas”
Neste caso quem ganhou? Os consumidores, portanto quase todos; quem perdeu? Os membros das corporações, portanto pouquíssimos. Então, vivam as políticas anti-inflacionistas! Mais não são do que a aplicação prática do conceito “os ricos que paguem a crise!” Donde, fácil será concluir que políticas inflacionistas, consubstanciadas geralmente pela prodigalidade dos subsídios, têm um efeito exactamente contrário. De resto, se quisermos ser consistentes, há para aí muitos mais “coitadinhos” a necessitarem urgentemente de compensações: desde o início dos anos 90, os produtos da IBM, da HP, da Nokia, da Siemens, da Olivetti e de outros que tais, baixaram muitíssimo mais de 50%. Não seria de desencadear desde já um “pacote de emergência”, antes que vão todos à falência?
3. O papel da agricultura - sem ser especialista em questões agrícolas, como penso que nenhum de nós é, tenho para mim que o fim dos apoios à agricultura na Europa não implicaria o fim desta. Não vejo porque é que não poderia seguir as pisadas da Nova Zelândia (um “case study” curiosamente pouco divulgado) que há vários anos cortou todos (mas todos!) os apoios ao sector agrícola e hoje consegue colocar produtos nos mercados internacionais.
No caso português, temos 2 grandes handicaps: o minifúndio existente em grande parte do País que obsta à produção em grande escala; muito pior do que isso, a mentalidade que se criou desde há quase 30 anos de que a agricultura é uma actividade indigna. A urbanização da sociedade pode coexistir perfeitamente com a existência de um sector agrícola pujante. É preciso para tal que apareçam empresários agrícolas (leia-se, conhecimento), que ainda não temos, para substituírem os agricultores, que vamos deixar de ter. Não tenho dúvidas que aqueles saberão fazer uma ocupação do território racional, até sob o ponto de vista ecológico, turístico ou cultural. É possível integrar todas estas vertentes e criar negócios interessantes. Sublinho a palavra negócios, porque só com a existência desse agente moralizador que é o lucro, poderemos ambicionar a um desenvolvimento sustentável.
No que concerne à dependência alimentar, de Portugal ou da Europa, considero isso uma falsa questão. É o eterno sonho da auto-suficiência que há muito deixou de existir. Pior do que a dependência alimentar, não será a dependência energética? Ou a tecnológica? Haja comércio, comércio, muito comércio e livre comércio entre todos os países, que estes problemas desaparecem. O comércio é um jogo de soma positiva para ambas as partes que o encetem de livre vontade e é porventura, juntamente com a liberdade, o principal factor de criação e manutenção da paz. E se o comércio for multilateral, qualquer problema do tipo vacas loucas se resolve trocando de fornecedor e estes serão sempre mais que muitos em mercado aberto.
Quanto ao argumento final do Cincinato, remeto para a interessante polémica que tem havido sobre a Nike entre o Valete Fratres, Liberdade de Expressão, Jaquinzinhos e Linhas de Esquerda. Eu só pretenderia terminar com algumas palavras sobre a “gente de segunda”, termo que eu nunca utilizei, mas que o Cincinato considerará estar implícito na minha “posta” anterior sobre a PAC. Mais uma vez, não irei esgrimir argumentos do foro da “consciência social”, ou sequer ao nível de valores morais ou humanistas, mas apenas cingir-me de novo a essa “gélida, árida e egoísta” lógica liberal. Se, por qualquer preconceito que tenha a ver com a cor da pele, a orientação sexual, a língua, a beleza ou falta dela, eu me recusar a negociar com determinada pessoa ou a admiti-la na minha empresa sem conhecer o seu verdadeiro potencial, estarei, no que aos meus interesses concerne, a cometer uma irracionalidade; e existirá fatalmente um concorrente, sem os meus preconceitos arcaicos, que se preocupará apenas em aferir o potencial da pessoa em causa e não hesitará em fechar negócio ou em admiti-la, caso conclua tratar-se de “gente de primeira”; e assim o meu concorrente terá ganho um parceiro dinâmico ou um colaborador eficaz que lhe permitirão crescer mais e melhor do que eu. Transpondo isto para a escala de países ou blocos, talvez a UE padeça de um excesso de pruridos e não esteja a reconhecer aos povos do terceiro mundo a capacidade de produzirem bens alimentares de forma eficiente, algo impensável nessa “gente de segunda”. E isto gera tensões; e as tensões podem gerar conflitos; e os conflitos podem alastrar e redundar em guerras. E as guerras geram sangue, suor, lágrimas e também fome e miséria.
Não consigo deixar de pensar nos meus filhos...

Das banalidades às verdades 

A propósito da “posta” do passado dia 26 sob o título “Banalidades e pobreza”, recebemos um e-mail do leitor Daniel Rodrigues que passamos a transcrever (em itálico), bem como a nossa réplica e a sua tréplica de hoje (em itálico). Interessante o apelo final do Sr. Daniel Rodrigues, mas desnecessário, pelo que nos toca. Muito antes de terem aderido à blogosfera, já os “matadores” deste blogue vinham fazendo e continuam a fazer intervenção a diversos níveis. A blogosfera permite-nos, com a máxima liberdade, fazer a intervenção mais importante, que é ao nível das ideias. E este País precisa, acima de tudo, de assentar ideias.
Um grande “Santiago” ao Sr. Daniel Rodrigues

On Thu, 26 Jun 2003 10:49:48 +0100, "Daniel da Cunha Rodrigues" wrote:

De facto, é triste, mas neste momento o país precisa é de ficar feliz e contente... De facto, é com um povo "alegrete" que podemos deixar de ser "pobretes"...
Nunca, como naquele S. João, os cidadãos de Vila Nova de Gaia tomaram consciência de que têm uma identidade tão significativa como a do Porto. O Dr. Luís Filipe Menezes, não obstante ter como objectivo ser Presidente da Câmara Municipal do Porto, está a potenciar a cidade da margem esquerda como uma das futuras cidades de referência do país, capaz de quebrar a hegemonia do Porto. Recordo que Portugal deriva de PortusCale - Portus e Cale, antigas cidades junto à Foz do Douro.
Algo é certo... os cidadãos de Gaia que diariamente se deslocam ao Porto para trabalhar, como todos os nortenhos se deslocam a Lisboa, a caminho da sede do poder político-económico, ganharam com certeza uma maior auto-estima em morarem na margem sul... E começam lentamente a não necessitar das suas raízes, entranhadas no Porto profundo, do qual foram escorraçados.
A Promoção deste evento é sem dúvida essencial. Na verdade, julgo que este espectáculo foi já várias vezes considerado internacionalmente como um dos melhores o mundo no género, a par do fogo de artificio, por exemplo, na Madeira.
Boa sorte na continuação do blog "Mata Mouros",
Com os melhores cumprimentos,

Daniel da Cunha Rodrigues



From: mata mouros [mailto:matamouros@justice.com]
Sent: sábado, 28 de Junho de 2003 17:03

Caro Sr. Daniel Rodrigues,

Ao contrário do seu Presidente que está preocupado apenas com a sua carreira pessoal, eu, cidadão comum, nascido em Trás-os-Montes mas residente na Invicta, preocupo-me com o Grande Porto. Hoje, falar do Porto é falar da sua Área Metropolitana, da qual Gaia é parte integrante. É nesta Área Metropolitana que (ainda) existe alguma massa crítica que nos pode permitir dar o salto para um estádio superior de desenvolvimento. E não nos adianta nada, bem pelo contrário, pôr-mo-nos com bairrismos serôdios, precisamente do género "o meu fogo foi melhor que o teu", ou "é desta que te vou roubar a hegemonia". Uma postura de extrema parolice como essa, faz as delícias dos centralistas de Lisboa, como se pode ver no Independente de ontem. Não é à custa da "fogachada" que se afirma a identidade de uma cidade ou de uma metrópole. Nos dias de hoje, é fundamental competir com base no conhecimento, porque só assim conseguiremos ombrear com outras cidades ou regiões. E só desenvolvendo conhecimento é que conseguimos criar produtos, serviços e marcas de prestígio que sejam tão bons ou melhores que os melhores. E para isto é necessário estudo e reflexão e não estarmos permanentemente embriagados pelo espectáculo fugaz. Por muito que me agrade ver um espectáculo de pirotecnia ou assistir à consagração do F.C.Porto aquém e além fronteiras, devo dizer-lhe que abdico de bom grado disso em troca de algumas dezenas de Sobrinhos Simões e de Belmiros de Azevedo que, com todo o conhecimento que incorporam e investimento que fazem, geram empregos e riqueza. Como decerto compreenderá, estou a assumir uma postura totalmente egoísta: é que Sobrinhos Simões e Belmiros a
criarem, a investigarem e a investirem hoje, dão-me muito mais garantias de, daqui por 10 ou 15 anos, os meus filhos conseguirem empregos qualificados (e portanto bem remunerados), não precisando então de demandarem Lisboa ou o estrangeiro; a alternativa seria tornarem-se técnicos de pirotecnia ou jogadores de futebol, mas, para além de ter de se nascer artista, as vagas não são tantas quanto isso...
Se andar 300 Km para norte, existe na Corunha um senhor chamado Amancio Ortega, de perfil extremamente discreto e que quase ninguém conhece e que é apenas... o homem mais rico de Espanha. E começou a sê-lo há pouco mais de 15 anos quando criou a Inditex, que hoje é dona de marcas mundialmente conhecidas como a Zara, Máximo Dutti, Pull & Bear e outras. Hoje a Inditex é uma multinacional gigantesca e, só na Corunha, dá empregos de forma directa ou indirecta a dezenas de milhares de pessoas. E não se pense que é emprego fabril mal remunerado. A Inditex não tem uma fábrica que seja: subcontrata a produção a Marrocos, a Taiwan, a Singapura e porventura a Portugal que, ao fim de tantos anos especializado na têxtil ainda não conseguiu criar uma marca de renome, continuando a vender mão-de-obra barata. A actividade da Inditex é bàsicamente focalizada no design e marketing, ou seja, actividades que "só" exigem conhecimento. Tenho pena que o Sr. Amâncio Ortega não tenha sido nado e criado na nossa metrópole. Posso dizer-lhe que o trocaria sem hesitar por mais de 5.000 Menezes.
Para terminar, eu não sei se o nosso fogo é ou já foi reconhecido internacionalmente como dos melhores do mundo. Mas o que é que isso nos adianta se não conseguimos chamar cá turistas para o verem e para o pagarem? Ficamos com o ego muito aconchegado, mas... e os nossos filhos? Conviria que pensássemos um bocado mais neles e menos em nós.
Era este o sentido do que escrevi no blogue, se bem que mais sintético. No fundo mais não quis do que exprimir uma preocupação (digamos mesmo, uma angústia) por ver a minha cidade (onde, repito, incluo Gaia, Matozinhos, Gondomar, etc) completamente anestesiada por populismos baratos e que já quase desaprendeu a pensar. A continuar assim, o futuro será cada vez mais “pobrete” e cada vez menos “alegrete”.
Fico à sua inteira disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais.
Melhores cumprimentos,
LR


Bom dia caro LR,

De facto, concordo em absoluto com essa postura... Seria preferível dúzias de pessoas capazes de arriscar, capazes procurar o sucesso do que os milhares de embriagados que se deslocam para festas. Seria preferível o trabalho à celebração.
No entanto, tanto em Portugal, como nos restantes países quer da Europa, quer de todo o mundo, as pessoas capazes de tal abnegação escasseiam, se olharmos proporcionalmente. Portanto, teremos de construir o mundo com as "massas". Existe uma figura que considero caricata para caracterizar essas massas para além do Zé Povinho português, que é o polícia Americano. Do país teoricamente mais desenvolvido e empreendedor.
E é esta questão que eu acho que é frequentemente desprezada pelas pessoas que têm a responsabilidade de pensar Portugal. As massas existem. São pessoas que podiam pensar Portugal, ouvir ópera, ler jornais, doutorar-se, mas simplesmente não querem. Preferem dar um contributo reduzido, e sentem-se preenchidas desta forma. Eu próprio estou a ponderar essa perspectiva de vida, mas ainda não me tornei tão egoísta. Os políticos têm este mérito. Decidiram entregar-se à vida política. De forma, que, o que resta, são sem dúvidas pessoas que preferem o brilho, os cumprimentos de "Bravo Sr. Presidente", a uma construção sólida para assegurar um futuro mais próspero. E o que falta é uma renovação mais constante desta classe. Nos quais, o LR está incluído, mas passarei a explicitar isso dentro de alguns parágrafos.
Dizendo desde já que concordo por inteiro com LR, desejo apenas salientar que a minha perspectiva complementa a sua, nos seguintes pontos:
-O foguetório é necessário para os 400.000 mil habitantes de Gaia elevarem a sua estima, atendendo a que não são Sobrinhos Simões ou Belmiros de Azevedo. Quando forem trabalhar nos dias subsequentes para o Continente ou no IPATIMUP irão trabalhar com um espírito predisposto a aceitar a natural exigência dos seus responsáveis.
-É necessário portanto que os responsáveis camarários sejam responsáveis pelo bem-estar das suas populações. Evidentemente, tendo bons equipamentos desportivos, culturais e de lazer. Mas faço notar que o cultural de massas não deve ser menosprezado, ao contrário do que muitos intelectuais julgam. As telenovelas, as festas populares (nas quais o fogo de artificio desempenha um papel fulcral), todas as programações aparentemente "vazias", contribuem significativamente mais do que todas as programações de teatro do T.N.S.J. a que até hoje assisti.
-O espectáculo triste e lamentável a que alguns políticos nos acostumam, só pode ser parado quando quem tem as capacidades de pensar Portugal a médio e longo prazo assumir as suas responsabilidades. E isso implica cerrar os dentes, sofrer injustiças, abdicar por vezes de algumas coisas mais importantes, como a família, mas para além de escrever artigos de opinião sem dúvida fantásticos, moralizadores, estarem na frente do combate político. Interventivos nas associações a que pertencem, seja um partido político, um sindicato, uma confraria, uma colectividade. Provar que as suas palavras são de facto transformáveis em projectos concretos. Porque a actual classe política está lá por não ter verdadeira oposição, no campo de batalha, digamos.
-O problema de imagem é, infelizmente, de todos conhecido. Recentemente, um responsável da EFACEC comentava um concurso que apresentaram na Republica Checa. Acharam o produto fabuloso, mas não o quiseram por ser de fabrico português. Apenas e só, segundo afirmaram, por terem a ideia da tradicional incompetência Portuguesa. Mas penso que já nos apercebemos desse problema, e começamos a inverter a situação. Aliás, a EFACEC acabou por entrar nesse mesmo mercado por outra porta, e agora, os nteriores investidores já se mostraram arrependidos. O referido responsável, naturalmente, aceitou o lapso, diplomaticamente, a ofensa, a injúria, e não se escondeu atrás de honra para recusar o novo negócio.
Disso trata a minha conclusão:
Através de si, caro LR, lanço o apelo a que o Universo Blog, saia para as ruas. Prove, que há um rosto decidido por detrás das palavras. Transforme os partidos, os sindicatos, as associações. Será uma utopia,
talvez. Mas são todos vocês, quando falo de quem tem capacidades para pensar Portugal, a quem se exige a capacidade de concretizar em projectos as ideias e a argumentação decidida que apresentam. Isso implica sofrer reveses, suportar ofensas, o cacique, humilhações. Por vezes, parecer não honrado. Mas, como católico que sou, tenho fé no arrependimento e no perdão, ao contrário do Dr. Ferro Rodrigues. E acredito que muitos políticos ainda acreditam no serviço que prestam às populações, e que, com bases que minem o caciquismo, a desfaçatez, a incúria, enfim, que estejam activas, mas não precisem da política,
poderão desempenhar um papel bem melhor. Naturalmente não incluo o Dr. Luís Filipe Menezes neste leque, mas incluo, por exemplo, um Dr. Mota Amaral ou o Dr. Miguel Cadilhe, ou o Dr. Bagão Félix. Gente mais interessada em Servir, do que em servir-se.

Agradecendo a atenção dispensada,
Daniel da Cunha Rodrigues

Taxistas 

Unidos venceremos parece ser o lema da "classe". A julgar pelas últimas notícias, a sr.a Ministra das Finanças admite rever os pagamentos especiais por conta (PEC) para os taxistas "das zonas rurais". Pagar impostos é um dever fundamental de todos os cidadãos, embora algumas decisões do Governo em matéria fiscal pareçam justificar um incumprinmento de tal dever (cf., p. ex., "Apelo à revolta"). Em rigor, os PEC, não são "pagamento de impostos", já que há uma inversão do processo de cobrança (a cobrança antecede a liquidação). Os PEC visam dois objectivos: um, a antecipação da cobrança (no fundo, um crédito gratuito ao Estado), outro, um efeito de anestesia fiscal (em vez de pagarem todo o imposto de uma vez, empresas e empresários pagam-no aos bochechos, pelo que custa menos "passar o cheque"). Porém, quando o Governo exagera nos montantes dos PEC e trata todos de forma igual, o efeito de anestesia fiscal desaparece. E a ideia de emprestar forçada e gratuitamente dinheiro ao Estado causa os resultados que temos vindo a ver.
O problema não é tanto o do tratamento diferenciado interior (ou mundo rural, como lhe chamam agora)/litoral, mas o da dimensão das empresas. Exigir-se a uma empresa com 10 ou 20 táxis um PEC idêntico ao de uma empresa com um único veículo é, manifestamente, desproporcionado. Todavia, tornou-se difícil ao Governo emendar a mão, sob as ameaças do sector. Ceder em parte (para o mundo rural), não corrige o erro e só servirá para aumentar a contestação à decisão do Governo. Um erro não se corrige com outro erro.

2003/06/29

Pela última vez, Sevilha 

(Publico, edição de 29/06/2003)

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